segunda-feira, 29 de novembro de 2010


Olha, sei que nós não temos muito tempo mais, mas você sabe que embarcou nesse barco por vontade própria. Te avisei e ainda tentei te alertar sobre os problemas que poderíamos ter no futuro, mas a tua curiosidade gritou mais alto na consciência. Não sei se você consegue se lembrar, mas eu te alertei também sobre as regras de quem navega aqui: não há volta; você entrou, agora terá que continuar. Eu sei que esse Sol está agredindo a tua pele e que essa falta de ver um pouco de terra firme está solidificando a sua loucura, mas precisa aguentar firme. Você pode me ajudar a remar, se quiser, porque assim a gente vai poder chegar a algum lugar, nem que seja em um chamado lugar nenhum. Tenho reparado também que tua vontade de viver tem se suicidado aqui e eu até entendo, pois então, tenta me entender também. Eu comecei nessa viagem com um mapa certo para o meu destino e sabe o que aconteceu? Não, talvez você consiga imaginar, mas é ainda mais trágico. Talvez soe um pouco patético, mas o destino fez questão de me arrancar qualquer plano e direção. E sabe o que eu fiz? Meu bem, eu remei. Remei... Remei... Remei... E quando me faltava forças para continuar, eu rezei. Rezei não para Deus, porque você já me conhece, não consigo acreditar, sou um pouco ateu, mas a fé está movendo as minhas vontades, apesar disso, rezei para mim mesmo, coloquei-me em lugar de ser supremo. E assim que me senti por todo esse tempo. Eu era invencível. Eu era forte, destemido. Eu era aço. Mas o tempo tratou de corroer as minhas partes e então eu acordei pra vida. Eu sabia que se continuasse a remar, encontraria novos remos; e eu encontrei. Aos poucos, surgiram um ou dois remos, mas eles logo se quebravam. As pessoas até tentavam, mas a força de vontade delas não era compatível com a minha, eu não tinha pra onde ir, mas queria chegar a algum lugar, qualquer um. Pessoas são naturalmente egoístas e foi por isso que eu disse, antes de entrar aqui, que o meu barco está furado, mas que tu eras bem vinda. Talvez eu ainda não tenha te contado, mas você me trouxe nossas esperanças, sabe, o Sol refletia em você e... Ah... Eu... Eu sentia uma vontade louca de te levar comigo. Senti medo de ser renegado ou de você desistir também. Você, dama tão frágil, menina perdida... Como eu estava errado. Com o tempo, o mesmo que me tirou tudo, percebi que essa minha visão era puro egoísmo, que precisava olhar mais a fundo. E... Olha, me surpreendi. Você, um dia, acordou e pegou nos remos e remou. E te ver remar me deixou com vontade de remar. Olha, eu sei que o nosso barco tá furado, que a gente não sabe pra onde tá indo, que essa vontade de chegar a terra firme tá sufocando a gente, mas você sabe que um dia a gente chega e se você aguentar, eu vou aguentar também. Nós aguentaremos, então.

O texto é pra ela. Somente pra ela.